05 abril, 2010

Vidro (parte 2)

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Sinto falta dos meus amigos, onde estão? Compartilhei meus machucados sempre com eles, os curei com eles, e agora? Quem são eles? Não os reconheço mais. Não, não estou generalizando, mas a vida realmente parece me fazer escolher uma garota que mal conheço para contar minhas dores, minhas desventuras, minhas trincas, minhas não lágrimas, meu sorriso aparentemente verdadeiro. Alana não faça as pessoas de objetos, não faça isso, não faça aquilo. Não minto, não omito, não iludo, não desiludo, não digo que te gosto sem te gostar. Mas que infame, me jogas ao inferno, ninguém te avisou que adoro um fogo? Que não derramo lágrimas por essas histórias tão repetidas, dessa minha vida tão sofrida, vamos evoluir, já que não nascemos para ser felizes. Alguém me arranja uns óculos escuros? Preciso abafar os sons dos meus ouvidos gritando terem avisado que isso iria ocorrer. Ninguém abriu minha cabeça há contáveis horas atrás. Eu disse ontem que tudo iria mudar, que achava estranho, que te achava estranho. Não, não! São neuras, de uma neurótica tudo são neuras. O quanto de mim voltou a se apagar? O quanto de mim se jogou da ponte? E o quanto de mim está aqui agora? A primeira vez que me disse: “eu te amo”, me assustei, não respondi, hesitei, logo depois te informei da reciprocidade desse sentimento. Fui ver a novela ao chegar a minha casa pensando nas tuas palavras, todas as músicas pareciam ter sido escritas só para mim, fui invadida por aquela sensação egoísta dos apaixonados. Parecíamos para todos um casal lindo, tão bonita nossa estética, tão agradável, meu amigo disse que iríamos no casar na quarta passada, me lembro. Divórcios me parecem mais certos que casamentos. Todos tinham a certeza do teu amor por mim, todos, menos eu. Desagradável saber que estava certa. Escuto todos os detalhes dos fatos por pessoas que me parecem mais imparciais, não agüento mais essa mesma visão dos fatos. Gosto de ver tudo sangrar com mais intensidade ao saber do seu risinho ao olhar para cima, da data, do que foi dito e deixou de ser dito, das reações dos outros ao ver minha vida tão exposta ao alcance toque da ponta dos seus dedos.

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Vidro (parte 1)


Você me confessa que tenho o conjunto de características que te desagradam, meu cabelo sempre descolorido, minha altura mediana, até o mês que nasci parece não se encaixar nas suas lacunas pretas e brancas, sempre tão escorpiana descontrolada, jogo bolsas e um segundo depois estou te dando beijos para curar todas suas dores. Parece me perguntar sempre coisas tão obvias, sobre o motivo dos meus risos bestas durante o dia, respondo sobre tudo sem te falar que é por você. Para um começo tão belo, só podia haver um final dramático. Para uma atriz, só poderia haver uma encenação. Quando virei platéia do seu espetáculo? Quando me entreguei, me joguei, me matei? Só vejo uma chama, uma única chama, para quem sempre gostou de brincar com fogo, só resta uma chama e tenha certeza que não é do nosso pseudo amor, quero dizer, do meu pseudo amor. Para uma piromaniaca uma chama nunca satisfaz, sempre mais, vejo pedaços de fogos derramados no chão, no quarto e na minha cama. Amar sozinha é um prato cheio para atrizes egocêntricas que andam atrás de uma tristeza dessas de filme só para se inspirar mais, escrever mais, viciar mais. Vamos aos meus monólogos, aos meus textos, as minhas cinzas. Quem parecia tão apaixonada nas primeiras linhas, viu se desfazer as letras em outra combinação e tudo que pensou ser, no chão, tijolos e cheiro de tinta que até me agrada. Me regenerar? Meu pulmão, que pulmão, que coração, que asneira. Aplaudo a ti e aos meus amigos, que agora são teus amigos. E para todos que me faço parecer tão frágil, saiba que finjo, aparento ser, aparento não ser o que sou. Que carência, que desilusões amorosas as suas, que frases bonitas, que conjunto de ilusões agradavelmente mortíferas.

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04 abril, 2010

Me revelo num bilhete


Me revelo,
Esse poço de carência oscilante,
Em chamas de mãos frias.
Com todas as fotos em cima da mesa
Para você um dia reparar que nunca sou a mesma.
Desfaço seus pensamentos,
Refaço seus planos.
Sensibilidade a flor da pele,
Risos ofegantes,
Oscilações, cada vez mais constantes.
Meu medo acelera
O meu coração, o dilacerar de dúvidas.
Até que a certeza vem me acalmar
Que isso não vai passar.