06 junho, 2008

Começar de novo

"Triim!", ouviu-se o soar da campainha que marcava o fim das aulas na faculdade Brown, na qual Milla Cabral cursava letras. Era o sinal que dizia que todos podiam ir embora, passar algum tempo com sua família.
Mas não Milla. Hoje, era uma jovem feliz, na medida do possível, mas antes fora uma adolescente triste e introvertida.Tudo isso graças a um trauma de seu passado, não muito distante.
Lembrara-se como se fosse hoje o dia catastrófico no qual sua vida mudou.
Acordou normalmente, como fazia todos os dias, e seu primeiro pensamento foi que aquele seria um dia como todos os outros. De manhã, ficaria na faculdade.
Morava com sua mãe em uma pequena casa na parte mais periférica da cidade. Passava todas as suas manhãs na faculdade, e à tarde ajudava sua mãe no preparo de comidas no fogão à lenha da pequena cozinha. Os pratos preparados eram vendidos na feira, rendiam um pequeno dinheiro que ajudava nas despesas da casa.
Milla levantou-se e fez sua higiene matinal como de costume. Vestiu-se e saiu para a faculdade, dando um beijo corrido em sua mãe, mal olhando-a nos olhos.
Teve as aulas como sempre e, ao soar da sineta, saiu da faculdade e foi até a parada de ônibus, esperar o transporte que a levaria o mais próximo possível de sua modesta moradia. Teve que fazer o caminho em pé, pois não haviam lugares vagos.
Desceu no ponto de sempre e pôs-se a andar os últimos metros até sua casa. Ao iniciar a caminhada, um cheiro de fumaça invadiu-lhe as narinas. Não tardou a avistar, ao longe, sua casa em chamas.
Correu o mais rápido que pôde, pensando em sua mãe, provavelmente presa nas chamas. Não percebeu que alguém tinha chamado os bombeiros, nem que estes já haviam apagado boa parte do fogo. A única coisa que percebeu foi que a parte da casa onde ela sabia ficar a cozinha ainda ardia em chamas, e que sua mãe provavelmente estava lá.
Tentou entrar na casa para socorrê-la, mas foi impedida por um dos bombeiros que rodeavam a casa.
Vários minutos depois, viu o fogo se apagar, deixando boa parte da casa destruída, e uma maca saiu de lá carregando sua mãe, aparentemente adormecida e com várias queimaduras que lhe pareciam graves.
Seu rosto, já lavado por lágrimas, foi banhado por mais delas ao ver a maca se direcionar a uma ambulância.
Correu à ambulância e alguém lhe perguntou se era parente da mulher. Tirando foras de um lugar que não sabia qual, respondeu-lhe que era sua filha, e foi conduzida, em alta velocidade pela ambulância, a um hospital.
Lá chegando, conduziram a maca à sala de emergência e levaram-na a uma sala de espera.
Os minutos passavam angustiantemente lentos e Milla foi obrigada a esperar sentada em uma cadeira de plástico branca, como quase tudo na sala, as lágrimas escorrendo incessantemente por seu rosto, até que um médico aproximou-se dela e deu-lhe a notícia fatal.
Sua mãe havia falecido. Havia sofrido queimaduras de 3º grau e inspirado gases nocivos presentes na fumaça do incêndio, pois estava no local onde o fogo começou, a cozinha com o fogão de lenha, a provável causa do desastre.
Não conseguindo resistir, Milla desmaiou quase no mesmo instante. Despertou um tempo depois, ainda na sala de espera, e foi informada que o hospital cuidaria do sepultamento de sua mãe, como fazia com os menos afortunados. Ficou imensamente grata.
Estava presente no dia, junto com dois homens que guiaram o caixão onde descansava sua mãe para além do solo. Lançou uma rosa branca para ela e, ao fim do velório, retirou-se do cemitério, como se deixasse a metade de si lá dentro.
Dirigiu-se à pousada de baixa qualidade onde estava hospedada, o que pôde pagar com suas economias, a muito custo retiradas de dentro da casa, com o que restou de todos os seus pertences.
Começou uma busca interminável por trabalho e moradia. Quanto ao emprego teve sorte, encontrou um trabalho de meio período numa pequena livraria no centro da cidade, após poucos dias instalada na pousada.
Não obteve, porém, a mesma sorte quanto a um lugar para morar. Passou muitos dias naquela pousada, o tempo todo com um jornal na frente do rosto, examinando a seção de Classificados e sem encontrar um bom local que coubesse no seu orçamento.
Mal conversava com as pessoas e na agüentava mais o cheiro de mofo que todos os móveis e locais da pousada tinham.
Foi quando, em um dia de bastante sorte, quase dois meses depois a ocasião que lhe trouxera até ali, viu o anúncio perfeito.
Um universitário chamado Paulo Vale procurava alguém com quem pudesse dividir as despesas de uma casinha.
Tinha 19 anos, a mesma idade que ela, e fazia faculdade de Design Gráfico numa Universidade à Zona Norte da cidade.
Ficou apreensiva de início, mas era sua única chance. No mesmo dia foi até o endereço indicado no anúncio.
Bateu à porta e esperou. Ouviu ruídos do outro lado, e a porta se abriu, revelando um rapaz não muito alto, moreno, os olhos castanhos e um cabelo com os últimos vestígios de tinta vermelha. Usava um boné virado para trás.
Informou-lhe o que queria e ele, abrindo um largo sorriso, mandou-a entrar. Conversaram um pouco e, tendo afinidade imediata, fecharam o negócio. No dia seguinte Milla transferiu seus pertences para a casa. A mudança foi rápida por motivos óbvios: Não tinha muita coisa a levar. Seus pertences se resumiam a uma mala pequena e uma mochila.
Desde então morava com Paulo, ignorando o preconceito da sociedade em relação a um casal de pessoas que, não sendo casados, namorados ou parentes, moram juntos sem nenhum problema.
Aproximando-se de casa naquele dia, Milla avistou Paulo do lado de fora da casa. Chegou mais perto e o abraçou.
Ambos sabiam que aquele abraço era um agradecimento pela chance que ele havia lhe dado. Chance de começar de novo.


Fim
Natália Cristine

9 comentários:

elk santos disse...

poxa desculpa.....

tah mais cm faço esse negocio de credt???

Daniela Filipini disse...

ooii
linda história!! (:
triste, mas lindaa!

Barbara Jordao disse...

Nossa.. que historia.. textinho grande mais muito tocante.. !!! gostei... principalmente quando ela tem a chance de voltar graças a chance que paulo deu. gostei!^^
bjus

Anônimo disse...

Nooossaaaa ameei o textinho ..
Bem tocante mesmo! +.+'

Valeeu pela visitinha?!

Patricia disse...

Nossa!
Perdas,com segundas chances.
adorei teu modo de escrever.
tens um bom vocabulário :)

beijo

Cibele disse...

caramba, amei esse texto, amei mesmo.

Mustafa Şenalp disse...

çok güzel site .:)

Unknown disse...

Que história triste. Mas muito bem escrita Naty. Parabéns.
Também adorei o seu blog.
Não li todos os posts, mas os que eu li eu adorei.
O Lixo de Vida ficou demais.
E a Lana, também escreve muito bem.

Boa semana, beijos;*

Lord of Erewhon disse...

Triste, mas muito bonito.